A barreira linguística não é mais um obstáculo para centenas de estudantes migrantes no Distrito Federal. A Secretaria de Educação do DF (SEEDF) implementou, em janeiro deste ano, a Política de Acolhimento a Migrantes Internacionais Falantes de Outras Línguas, chamada Bem-vindos ao Distrito Federal, regulamentada pela Portaria nº 94/2025. Essa iniciativa garante acesso à educação para migrantes, refugiados, apátridas e emigrantes retornados, priorizando o ensino de Português como Língua de Acolhimento (PLAc).

As primeiras turmas estão funcionando em seis centros interescolares de línguas (CILs) — Guará, Asa Norte, Ceilândia, Samambaia, Taguatinga e São Sebastião — atendendo estudantes a partir do 6º ano do ensino fundamental. Crianças menores recebem apoio diretamente nas escolas, promovendo ambientes multilíngues e inclusivos.

A diretora do CIL do Guará, Taiana Santana, destaca o significado dessa transformação para a política pública. “Já tivemos formaturas deles falando em português, eventos com comidas típicas, e nossos alunos conheceram culturas diferentes. Hoje temos 160 alunos, além dos mais de 300 que já passaram pelo curso.”

A política também inclui cursos de formação continuada para professores e a criação de materiais específicos, como o Caderno Pedagógico Migrantes e o videocast Migrantes Internacionais: a língua como acolhimento, disponíveis no YouTube da Escola de Formação Continuada dos Profissionais da Educação (Eape) e no site da secretaria. Também foi produzido o documentário CILG – Bem-vindos ao DF – Migrantes Internacionais, que retrata a experiência no CIL do Guará.

A implementação da política contou com uma formação continuada, em parceria entre a Subsecretaria de Educação Inclusiva e Integral (Subin) e a Eape, visando professores de línguas que atuam nas turmas iniciais do PLAc. A Diretoria de Educação em Direitos Humanos e Diversidade (DDHD) coordena as ações e garante a matrícula de estudantes migrantes, mesmo sem documentação, oferecendo orientações práticas através da Circular nº 27/2024.

A vice-diretora do CIL do Guará, Priscila Mesquita, ressalta que o curso é reconhecido pela Polícia Federal, facilitando o processo de legalização dos migrantes no país. “Isso muda o destino deles: integração, oportunidades de trabalho e socialização. É uma troca muito rica.”

Muito além do idioma

O Português como Língua de Acolhimento visa ensinar o idioma e a cultura brasileira. O curso é híbrido, com aulas online e presenciais, permitindo a inclusão de quem trabalha, além de atendimentos individualizados para iniciantes ou falantes de línguas diferentes do português, como o árabe.

A coordenadora do CIL do Guará, Danielle Paz, enfatiza que o PLAc vai além do aprendizado da língua, promovendo trocas culturais e um olhar humanizado para cada estudante. “Atendemos migrantes internacionais em situação de refúgio, que necessitam aprender o idioma para viabilizar a vida aqui.” Danielle destaca que no início do curso é feita uma avaliação chamada needs analysis para adaptar as necessidades de cada aluno, respeitando suas culturas e tradições.

O professor Pedro Reis, que atuou nas primeiras turmas, compartilha a experiência de lecionar para um público diverso. “Trabalhar com pessoas do Haiti, Congo, Vietnã e Holanda no nível iniciante foi bastante desafiador e enriquecedor. Ensinar elementos da cultura brasileira e aprender sobre as culturas deles foi uma experiência valiosa.”

Vozes de quem aprende

A bangladesa Humaira Ferdousi, há dois anos no Brasil, encontrou em seu curso uma solução para a comunicação, que anteriormente era difícil até nas tarefas cotidianas. “Quando cheguei, não entendia nada de português. Agora posso perguntar e comprar com mais facilidade. Fui muito bem recebida; os professores e colegas são muito amigáveis.”

O colombiano Carlos Athuro Gomez, de 71 anos, também aprecia a cultura brasileira e destaca a importância do CIL na sua adaptação. “Precisamos aprender português para agir, trabalhar e integrar na comunidade. Estou muito feliz em viver aqui e por ter encontrado um lugar como o CIL.”